quarta-feira, 1 de junho de 2011

GAMES DE CORRIDA


VERDADEIRA FEBRE NOTURNA, OS GAMES LEVAM CADA VEZ MAIS JOGADORES A ACELERAR EM GRANDES CIRCUITOS - SEM SAIR DO SOFÁ. 

POR ISADORA CARVALHO



De brinquedo eles não têm quase nada. Utilizando o que há de mais avançado em realismo em simulação, os videogames são levados a sério por um público cada vez maior. Games como Fórmula 1 2010, Need for Speed, Forza Motorsport 3 e o mais recente Gran Turismo 5, conhecido como GT5, lançado em dezembro para o PlayStation 3 (veja quadro), absorvem a atenção e horas de sono de muita gente grande. 

É o caso do designer carioca Marcus Rizzo. Certa vez, ele passou 28 horas seguidas jogando Need For Speed e bebendo apenas refrigerante. Esqueceu-se de se alimentar e acabou com uma crise convulsiva. Depois foi diagnosticado com epilepsia. "Os médicos disseram que o fato de eu ter ficado muitas horas grudado na tela pode ter contribuído para a manifestação da doença", diz Rizzo. "Agora, por recomendação médica, passei a jogar no máximo duas horas por dia." Rizzo pode ser um caso extremo, mas há uma legião crescente de pilotos domésticos. A febre dos jogos automobilísticos é tanta que o GT5 já vendeu 6,3 milhões de unidades em menos de quatro meses em todo o mundo. 

O analista de câmbio Fábio Osmak não aguentou esperar o lançamento do GT5. Ficou dias navegando na internet em busca de um lugar que já vendesse o produto por aqui. Correu para a loja oficial da Sony em São Paulo e foi um dos primeiros brasileiros a colocar as mãos no desejado jogo, que custa 199 reais. A espera pelo game era tão grande que alguns vizinhos bateram em sua porta apenas para conferir as novidades, que Fábio fez questão de desvendar logo nos primeiros dias. "No começo, passava de 4 a 5 horas diárias na frente da TV e agora estou quase terminando a última fase", diz. 

E olha que os desafios não são poucos nessa última versão do jogo que simula circuitos de corrida. É possível customizar e adaptar cerca de 1000 carros, incluindo modelos de rali, de kart e da categoria Nascar americana. São mais de 20 pistas que têm de ser conquistadas. Quanto mais pontos se ganha, maior é o número de circuitos nos quais se está autorizado a pilotar. "Os jogos de hoje são mais viciantes porque são muito fiéis à realidade e exigem maior concentração", afirma o psiquiatra Daniel Tornaim Spritzer, coordenador do Grupo de Estudos sobre Adições Tecnológicas (GEAT), de Porto Alegre (RS). Segundo o especialista, a dependência não se define pelo número de horas que a pessoa passa em frente ao aparelho. Ela só aparece quando a saúde e o relacionamento pessoal do usuário começam a ser realmente afetados. 

O empresário João Seferian Junior, de São Paulo, deixa até de descansar para se divertir no GT5. Dono de sete lojas de sapatos, ele chega do trabalho às 19h e passa em média 5 horas pilotando o joystick à noite. "Às vezes brinco até as 3 da madrugada", diz ele. "Há um mês, meu videogame travou e, como a assistência técnica não deu previsão de conserto, comprei outro no dia seguinte." Quem reclama da mania é sua esposa Erika. "Tem sábado e domingo que ele não quer sair de casa só para poder jogar", afirma ela. 

Segundo artigo publicado em 2009 nos Estados Unidos, 36% dos americanos usam games de corrida regularmente - 80% deles são homens, que se divertem, em média, 31 horas por mês. Já as mulheres brincam cerca de 6 horas. A estudante gaúcha Pricila Lameira contradiz as estatísticas. "Já cheguei a jogar mais de 10 horas por dia, a cada vez que uma nova edição de Need For Speed era lançada", diz ela, que já participou de cerca de 20 competições e alcançou a quinta colocação no ranking nacional. Segundo Pricila, a participação das meninas em campeonatos tem aumentado. "Quando comecei, muitas vezes era a única garota." 

Curvas em casa 
Exímios pilotos em frente às telas podem igualmente ser bons motoristas longe delas. É o que defende um estudo da Universidade de Manchester, na Inglaterra, divulgado em setembro. Segundo a pesquisa, jogos de corrida tendem a melhorar o desempenho na direção e contribuem para uma condução mais atenta. "Uma vez que as simulações respeitam mais as leis da física, como a gravidade e a dinâmica, o tempo de reação pode diminuir", diz o engenheiro de tráfego Fernando Sérgio Bisca, de Campinas (SP), também adepto do joystick. O piloto de Stock Car Allam Khodair diz que já usou um dos simuladores de computador para conhecer melhor uma pista fora do Brasil. "Quando cheguei lá, sabia onde ficavam todas as curvas e como contorná-las da maneira mais rápida", afirma ele, que costuma virar noites com o lançamento F-1 2010. 

De acordo com uma pesquisa da Continental Pneus divulgada em janeiro deste ano, porém, jogadores inveterados podem estar mais propensos a acidentes de carro nas ruas porque não correm riscos reais no mundo virtual. Eles tenderiam a transferir essa inconsequência para o volante, tornandose motoristas imprudentes. "Games que permitem que as pessoas corram dentro de cidades, como o GTA, contribuem para uma direção mais insegura", afirma o psiquiatra Daniel Spritzer.

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